Título: 8 / Edição:
Fevereiro de 2014, PAD / 8.7/10 | EG
Nas alturas em que o material informático circulava
maioritariamente através de uma coisa chamada disquete, fez-se nascer um jogo
que iria, a seu tempo, marcar uma geração: o Sensible Soccer. Como tudo na vida se resume a um ciclo, o tempo
também tratou de pôr fim à glória daquele que foi um dos primeiros simuladores
futebolísticos de todos os tempos. Após aproximadamente duas décadas da extinção
de Sensible Soccer, nasciam os
nortenhos Sensible Soccers, através
da edição de um EP homónimo.
Rapidamente se deu a sua apreciação, em boa parte
devido à maneira assinalável como se conciliavam guitarras, teclados e
panóplias electrónicas. De imediato se ergueram clássicos, como “Fernanda” ou “Missé-Missé”.
Não tão instantânea foi a celebração de “Twin Turbo”, tema escolhido pelas
gentes de Cristiano Ronaldo como OST do vídeo de agradecimento aos fãs do craque
madeirense pela sua conquista da bola d’ouro. Depois da edição do EP de estreia,
em 2011, os Sensible Soccers apenas
lançaram um single, “Sofrendo por
Você”, já no decorrer do ano passado. Seria legítimo esperarmos uns Sensible Soccers próximos da linha
sonora de “Sofrendo Por Você”, que nos demonstrava a sua capacidade em fazer a festa
sozinhos através do uso e abuso (no bom sentido) de sintetizadores, de um groove estrondoso e da irreversível
vontade mútua (quer de quem a ouvisse, quer dos próprios Sensible Soccers) em passar do lugar e da forma em que os ouvíssemos
para uma pista de dança.
8
marca a estreia dos portuenses nos registos de longa-duração e contrariamente
ao que era expectável, não segue de um modo nítido a linhagem que se rabiscou
em nenhum dos seus registos anteriores, marcando, por isso, uma reinvenção sem
que se fale necessariamente em reinvenção; os sintetizadores continuam a ter um
papel preponderante na génese sonora, bem como a restante vertente electrónica,
mas as guitarras ganham uma ênfase peculiar, como ainda não tínhamos visto em
nenhum disco dos Sensible Soccers. É
usual e irremediável falarmos da importância do dedilhar da guitarra de Vini
Reilly, mentor dos The Durutti Column,
factor que também tem vindo a ser aproveitado por Miguel Nicolau, guitarrista
dos Memória de Peixe. É notório o
pesar da arte de tocar guitarra que marcou o movimento post-punk, mas também é verdade que a estética das canções dos Sensible Soccers não deixam que nenhum
dos seus principais moldes sobressaia em demasia: ainda bem.
Os sintetizadores são os agentes responsáveis pela aclimação
aos novos Sensible Soccers, sendo os
maiores responsáveis pelas primeiras duas canções do disco. “AFG”, terceira
peça de 8, trata de brotar a guitarra
para primeiro plano e é basicamente a partir desse momento que começa o
vendaval de futebol dos Sensible
Soccers. O modo como “AFG” se constrói ao longo do seu decorrer é genial:
guitarras primordialmente atmosféricas que se vão transformando com o tempo, e
distorção, em guitarras barulhentas e que nos vão despertando uma vontade
incrível de dançar, tal como nos tinha acontecido “Sofrendo por Você”. É
oficial: “AFG” é “Sofrendo por Você”, de 2014; encontrámos o “x”.
O disco segue
quase sempre a mesma filosofia, sobretudo no seu primeiro quarteto de canções:
momentos de tristeza marcados pelos, sobretudo, pelos sintetizadores a
contrabalançarem com a alegria efusiva que a guitarra vais mostrando sempre que
é chamada para aparecer em primeiro plano. A sua segunda parte, tal como num
jogo de futebol que esteja decidido ao intervalo (sim, porque a primeira parte
de 8 é partir para o intervalo com
uma larga vantagem), resume-se a segurar a vitória que já estava carimbada ao
intervalo; existe por lá uma maior monotonia e uma maior sintonia entre cada um
dos seus momentos, o que faz de 8 um
disco mais coeso, mas menos vibrante, mas que simultaneamente nos dá o lembrete
de que os portuenses são bons quer no seu processo mais ofensivo e livre, quer
no seu processo mais táctico e é extremamente raro encontramos algo assim,
tendo como referencial uma banda ou uma própria equipa de futebol.
Há um mês
atrás, no âmbito da lista das melhores canções nacionais e a propósito de “Sofrendo
por Você”, tinha referido os Sensible
Soccers como um dos nomes nacionais que mais tinham potencial para a tão
falado internacionalização que falta à música nacional. Com a edição de 8, tenho de voltar a referi-lo: está
aqui um disco tremendo e passados dois meses do início do ano é bom que se
mentalizem que vão encontrar poucos discos nos próximos dez meses com esta
qualidade. Ainda assim, caso essa internacionalização não chegue (e o Cristiano
Ronaldo bem tenta ajudar) não temos porque ficar tristes; afinal quem não gosta
de ver um jogador de classe mundial no campeonato português? Os Sensibe Soccers são cada vez mais um
desses jogadores.
Sem comentários:
Enviar um comentário