Se ouvirmos Nick Drake sem atentar antes na ordem
cronológica da sua obra discográfica, é quase irreversível não cair em erro; ao
contrário do que se possa pensar, Pink
Moon não é o primeiro disco do cantautor da Birmânia. É certo que é o seu
disco mais directo, mais simples, onde a
folk é mais clássica e concisa, sem que existam por lá devaneios, e sempre com
ela a cumprir o seu real conceito: guitarra na mão, poesia divinal, canções
extraordinariamente belas. Cereja em cima do bolo? Uma voz dócil, uma mestria
ao comando da guitarra e uma visão ideológica do mundo bastante peculiar. Tudo
isto se esquiva do que tinha sido feito pelo singer-songwriter até então, Five
Leaves Left, por exemplo, revela uma música com um corpo mais robusto,
incorporações de blues, jazz e até resquícios de country. Então o porquê de Nick Drake
ter explorado estes caminhos mais clichés da folk que, à partida, seriam mais óbvios após alguns (poucos – três,
na verdade) anos de carreira?
Em primeiro lugar, urge referi-lo: Nick Drake não deu mais
do que dois, três concertos para uma audiência superior a vinte ou trinta
pessoas. E isso tem uma explicação: a sua obra só mereceu reconhecimento quando
este nos deixou (é sempre aquela coisa de que quando morremos é que nos dão
valor, não é?). Talvez esse ponto, o do não reconhecimento da sua obra, o tenha
«obrigado» a alterar a sua música propriamente dita, porém jamais alguma vez
Nick pensou mudar a sua filosofia. «I was
born to love no one / No one to love me (…) I was made to love magic / All it’s
wonder to know». O amor presente nas canções de Nick Drake era nítido: não
se cantavam canções de amor para outras pessoas, declarava-se a Natureza para a Natureza, da vida para a vida.
«I was born to use my eyes / Dream with
sun and skies / To float away in a lifelong song». Pink Moon reflecte só mais um capítulo nesta ode à magia natural
das coisas.
«I saw it written and
I saw it say / The Pink Moon is on it’s way (…) pink, pink, pink. Pink Moon», está dado o ponto de partida para
o terceiro longa-duração do músico. E nada de novidades (a não ser o facto do
jazz, blues, etc., ter sido posto de parte): era Nick Drake quem ali estava.
Era Nick Drake que cantava. Era nitidamente uma canção escrita por si – e as
menções às coisas mais simples da vida comprovam-no. É efectivamente na
simplicidade das coisas que Pink Moon
(e aqui já não estamos a julgar apenas a canção título do LP) se revela
majestoso; é de uma beleza quase irrepetível a dimensão que Nick Drake dá às
suas composições utilizando para isso apenas três coisas: voz, guitarra e seu
génio.
Para além do facto de não existir uma simples música a que se
possa chamar razoável – são todas elas excelentes -, até nos interlúdios, Horn e Harverst Breed, Pink Moon se revela soberbo: à falta de
palavras para nos confortar a alma, há guitarras a acalmá-la, a acomodá-la.
Nunca nos sentiremos sós ao longo do disco, nunca a simplicidade foi tão
robusta. Até que se desenlace o disco, e passando por obras de arte como Things Behind The Sun ou Parasite, mais confirmações daquilo que
já se previa: que Pink Moon é um dos melhores discos da história da Folk, que
Nick Drake em vida merecia mais reconhecimento, que tardará a aparecer algo que
se faça tão belo de, além de tudo, tanta simplicidade. O povo está certo e se
ainda não te mentalizaste disso, segue o conselho: «Go play the game that you learnt, from the morning». Porque é nas
primeiras horas da manhã que nasce o dia, a vida, a naturza. O gesto mais
simples é aquele que mais impressiona.
Classificação final: 10/10
Sem comentários:
Enviar um comentário